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18 de Abril de 2024

A nova ação revisional do FGTS - Mais uma sentença procedente (1ª Região)!

Publicado por Gustavo Borceda
há 10 anos

Novidade: A nova ação revisional do FGTS - Acórdão da ADI 4357

Quase nem deu tempo de comemorar a primeira decisão de procedência e (pode começar a sorrir!) já surgiu outra, agora na 1ª Região. A informação foi postada aqui primeiramente pelo colega Joel Pereira dos Santos, nos comentários do texto sobre a sentença anterior, e quase imediatamente vários outros colegas também já informavam a notícia recentíssima, de hoje!

Originalmente veiculada pelo próprio site da Justiça Federal de Minas Gerais, a sentença na íntegra pode ser acessada à partir deste link, e se você também já achou a anterior extremamente bem fundamentada, coerente e promissora, então prepare-se para se empolgar definitivamente.

O julgado em questão, de lavra do Douto Juiz Federal Márcio José de Aguiar Barbosa, titular da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Pouso Alegre/MG, abordou diversos aspectos inéditos (para mim, claro) e solucionou (também para mim, que vinha patinando neste tópico da inicial) a grande questão da abordagem constitucional do artigo 13 da Lei 8361/91, e o fez com maestria no capítulo “A inconstitucionalização progressiva do art. 13 da lei 8.036/90 c/c arts. 1º e 17 da lei 8.177/91”. (grifei)

O capítulo é tão perfeito que dá vontade de copiar esta argumentação do jeito que está e incluir na inicial como um capítulo específico sobre a inconstitucionalidade do art. 13, porque depois de ler uma explicação tão detalhada e fundamentada, a inspiração, por ausência da musa necessidade, provavelmente não dará as caras neste tocante.

Sei que vocês já devem ter lido a sentença inteira (porque, se não, deveriam! E muitas vezes!), mas mesmo assim deixo aqui para registro uma das fundamentações mais perfeitas que já tive a oportunidade de ler:

“O dinamismo do Direito e da vida social que ele regula impõem, em certos casos, a necessidade de verificar a existência ou não de validade e legitimidade atuais de normas que, na sua origem, eram perfeitamente válidas e legítimas. Isso porque situações concretas da vida social e normatizações paralelas que incidem sobre os mesmos fatos originalmente tratados pela norma primitiva podem fazer com que seus objetivos se desvirtuem, seus fins, inicialmente válidos e legítimos, passem a se opor à Constituição e seus princípios.

Oriunda da teoria constitucionalista alemã e já sufragada pelo E. STF em alguns julgados (v. G. HC 70.514/SP, RE 147.776, RE 135.328/SP), é a construção doutrinária chamada de “inconstitucionalidade progressiva” ou progressivo processo de inconstitucionalização de normas jurídicas originariamente válidas.

É a situação dos autos. O art. 13 da lei 8.036/90, ao estabelecer que “ Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização juros de (três) por cento ao ano ”, claramente objetivava dar continuidade ao princípio estabelecido desde a lei 5.107/66 de que o pecúlio representado pelo FGTS é uma obrigação de valor, imune aos efeitos corrosivos da inflação, sujeito a correção monetária de seus depósitos e ainda vencendo juros remuneratórios “reais” (acima da inflação) de 3% ao ano.

Não apenas dava continuidade à tradição do FGTS, como densificava de forma válida, conforme à Constituição, o direito trabalhista fixado no art. , III, da CR/88, que previu o pecúlio obrigatório do fundo de garantia. Tratando-se de pecúlio obrigatório, não portável, a ser usufruído após longo prazo de sua formação, é mais razoável a interpretação de que a norma constitucional contém implicitamente a obrigatoriedade de que o valor desse fundo seja protegido da corrosão inflacionária.

À época da publicação da lei 8.036/90, a “atualização dos saldos dos depósitos de poupança” também era feita por índices de inflação. Fica claro que o art. 13 da lei 8.036/90, ao vincular a correção do FGTS à da poupança, visava à plena proteção do FGTS quanto aos efeitos corrosivos da inflação.

Com a edição da lei 8.177/91, que criou a TR no seu art. e no seu art. 17 estabeleceu que para fins do art. 13 da lei 8.036/90 a TR aplicável ao FGTS seria aquela calculada no dia primeiro de cada mês, as coisas já começam a tomar uma forma distinta.

A “atualização dos saldos dos depósitos da poupança” deixa de se dar por índice de correção monetária e passa a se dar pela TR, com metodologia a ser fixada por órgão administrativo, inicialmente objetivando ser uma previsão implícita de inflação futura feita pelo mercado financeiro, mas sem nenhuma garantia de que tal metodologia se manteria – como não se manteve. A necessidade de adequar a TR aos novos tempos de reduzidos juros reais e alteração no cálculo do imposto de renda das aplicações financeiras, fez com que ela fosse reduzida a ponto de se tornar praticamente nula, para evitar que houvesse uma fuga de recursos das aplicações financeiras para a caderneta de poupança. Isto é, progressivamente, o art. 13 da lei 8.036/90, c/c art. 17 da lei 8.177/91 e com o art. da lei 8.177/91, deixou de garantir ao FGTS a recomposição das perdas inflacionárias, sujeitando o FGTS a perdas consideráveis em relação à inflação. As tabelas abaixo dão uma idéia das imensas perdas incorridas e do caráter progressivo, da aceleração da perda do FGTS em relação à inflação medida por vários índices (a remuneração do FGTS nesses cálculos inclui a correção e os juros):”

A explicação da situação fática, que se sucede adiante, também é primorosa:

Em todas as tabelas, considera-se um depósito de R$1.000,00 feito em 01/07/1994 (início do Plano Real), 01/01/2003 (início do governo Lula) e 01/01/2011 (início do governo Dilma). Na primeira coluna à esquerda, está o valor atualizado desse depósito no FGTS (com correção e juros) e o mesmo valor atualizado por 3 índices de preço (INPC e IPCA, do IBGE, e IGP-M da FGV), até 01/01/2014. Na segunda linha das tabelas, o ganho ou perda acumulado da remuneração total do FGTS em relação aos índices. Na terceira linha, o ganho ou perda anual do FGTS em relação a cada índice. Observa-se que a remuneração total do FGTS (incluindo juros) é inferior ao IGP-M em todos os períodos e essa perda vai se acentuando com o passar do tempo: de 07/1994 a 01/2014 a perda anual é de - 0,9%, de 01/2003 a 01/2014 a perda anual é de -1,7% e no governo Dilma a perda chega a -2,41% ao ano. No caso dos índices do IBGE, no período desde o Plano Real há um pequeno ganho real anual (+0,35% e +0,48%, respectivamente), que se transforma em perdas reais anuais a partir do governo Lula (- 1,14% e -1,16%) e que são aumentadas no governo Dilma (-2,23% e -2,36%). Em termos econômicos, isso quer dizer que a taxa de juros reais do FGTS – que a lei prevê em +3% ao ano – está NEGATIVA: os beneficiários do FGTS estão perdendo da inflação ano a ano e essa perda tem se acelerado, chegando a -2,36% ao ano no governo Dilma, nos últimos 3 anos, pelo IPCA/ IBGE. Mesmo se considerarmos o período desde o Plano Real (primeira tabela) e os índices de preço do IBGE, os ganhos reais (acima da inflação) de +0,35% e +0,48% ao ano, respectivamente, são muito inferiores àquilo que a lei prevê, +3% ao ano.

Está claro que fatores alheios ao legislador da lei 8.036/90 fizeram com que o art. 13 progressivamente se tornasse inconstitucional, na parte em que vincula a correção monetária das contas do FGTS aos índices de atualização da poupança e estes, por sua vez, passam a ser calculados por metodologia prevista nos arts. e 17 da lei 8.177/91, que não mais garante a recomposição das perdas inflacionárias.

Como se viu no tópico anterior, a metodologia iniciada pela Resolução CMN 2.604, de 23/04/1999, com efeitos a partir de 01/06/1999, deu início ao descolamento da TR dos índices de inflação, sendo esse o momento que se deve fixar para a recomposição das contas do FGTS.

Diante do exposto, tendo em vista o que já decidido pelo E. STF no caso da lei 11.960/09 e o fato de o FGTS ser um pecúlio constitucional obrigatório, não portável e de longo prazo, cuja garantia de recomposição das perdas inflacionárias está implícita na disposição do art. , III, da CR/88, que assegura esse direito trabalhista fundamental a todos os trabalhadores, é de se declarar inconstitucional, pelo menos desde a superveniência dos efeitos da Resolução CMN 2.604, de 23/04/1999, a vinculação da correção monetária do FGTS à TR, conforme art. 13 da lei 8.036/90 c/c arts. e 17 da lei 8.177/91. Tendo havido pedido expresso para utilização do INPC e sendo esse índice utilizado nos benefícios previdenciários e, neste Juízo, para correção monetária das dívidas judiciais, entendo razoável e mais consentâneo com as finalidades do FGTS que seja esse o índice de correção monetária dos saldos do FGTS.

Diferente da decisão postada anteriormente, o índice adotado foi o INPC, e atentem para a especificação minuciosa da parte dispositiva, que responde várias dúvidas que têm surgido nos comentários dos textos anteriores:

"III - DISPOSITIVO Nessas razões, julgo parcialmente procedentes os pedidos para declarar a inconstitucionalidade parcial superveniente do art. 13 da lei 8.036/90 c/c arts. e 17 da lei 8.177/91, desde 01/06/1999, pela não vinculação da correção monetária do FGTS a índice que venha recompor a perda de poder aquisitivo da moeda, e condenar a CEF a: 1) no caso dos depósitos do FGTS não levantados até a data da recomposição: a) recalcular a correção do FGTS desde 01/06/1999, substituindo a atualização da TR pelo INPC, mesmo nos meses em que a TR for superior ao INPC ou que o INPC for negativo, mantendo-se os juros remuneratórios de 3% ao ano previstos no art. 13 da lei 8.036/90, depositando as diferenças corrigidas na (s) conta (s) vinculada (s) respectiva (s); b) pagar juros moratórios de 1% ao mês sobre as diferenças corrigidas apuradas no item a, desde a citação até a data da recomposição da (s) conta (s) vinculada (s), depositando os juros na (s) conta (s) vinculada (s) respectiva (s); 2) no caso dos depósitos do FGTS levantados entre 01/06/1999 até a data da recomposição: a) recalcular a correção do FGTS desde 01/06/1999, substituindo a atualização da TR pelo INPC, mesmo nos meses em que a TR for superior ao INPC ou que o INPC for negativo, mantendo-se os juros remuneratórios de 3% ao ano previstos no art. 13 da lei 8.036/90, até a data do levantamento a partir da qual a diferença deverá ser corrigida unicamente pelo INPC até o depósito em juízo nos termos do art. 475-J do CPC; b) pagar juros moratórios de 1% ao mês sobre as diferenças corrigidas do item a desde a citação até a data do depósito em juízo nos termos do art. 475-J do CPC. Indefiro a antecipação da tutela, haja vista a possibilidade de irreversibilidade do provimento, nos termos do art. 273, § 2º, do CPC, ausente também o periculum in mora, uma vez que não existe demonstração de interesse ou necessidade urgente de utilização dos recursos adicionais. Deferida a justiça gratuita, ante a existência dos pressupostos da lei 1.060/50. Sem custas, em vista da gratuidade judiciária. Em se tratando de causa do JEF, sem condenação em honorários; em se tratando de causa do procedimento ordinário, fixo honorários em trezentos reais, a serem pagos pela CEF, conforme art. 20, § 4º, do CPC, por se tratar de causa sem instrução probatória e com fundamentos padronizados, considerando a inconstitucionalidade do art. 29-C da lei 8.036/90. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Pouso Alegre/MG, 16 de janeiro de 2014."

Se a decisão anterior já foi extremamente animadora, esta vai além, consubstanciando-se numa verdadeira aula magna sobre o assunto. Em certas passagens, ganha ares monográficos e até literários. É, com efeito, o principal texto a ser observado por aqueles que querem entender a matéria, e para os que estão redigindo petições iniciais/embargos/recursos é simplesmente indispensável.

Vou parar por aqui (talvez escreva um artigo maior sobre estas duas decisões futuramente), porque a vontade compartilhar este magnífico texto é maior do que a de continuar escrevendo, mesmo porque não acho que tenha nada melhor pra dizer (e vocês para ler) do que o constante nestas duas decisões, que em menos de 24 horas modificaram significativamente o panorama de desesperança que parecia reinar absoluto.

Sorriam, amigos advogados, sorriam todos os trabalhadores, porque, ao menos por hoje, temos dois ótimos motivos para ter esperança.

PS1: Agradeço enfaticamente a todos os amigos que postaram o link para esta notícia nos comentários da anterior, e peço encarecidamente para que todos os que souberem de mais boas notícias como esta, que nos informe, por favor.

PS: Como não poderia deixar de ser (foram duas decisões em menos de 24 horas!), caiu uma tempestade cataclísmica por aqui, e por isso demorei um pouco pra postar esta decisão.

Leia também:

· A nova ação revisional do FGTS para recuperação das perdas e alteração da TR como índice de correção monetária (1999-2013) – Parte I

· [Parte II] A nova ação revisional do FGTS para recuperação das perdas e alteração da TR como índice de correção monetária (1999-2013)

· A nova ação revisional do FGTS - sentença procedente na 4ª Região!

· A nova ação revisional do FGTS - Planilha de atualização disponibilizada pelo TRF4

· A nova ação revisional do FGTS - Uma decisão alvissareira do JEF da 3ª Região!

· As primeiras decisões dos JEF's na nova Ação de Revisão da correção monetária do FGTS (TR)

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108 Comentários

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Parabéns pelo Trabalho Dr. Gustavo Bocerda!!! O JusBrasil é o Maior Sítio de Informações Jurídicas que Temos no Brasil!!!
Obrigado em Nome de Todos os Trabalhadores Brasileiros que vem sendo usurpados pelos meandros de um Judiciário até bem Pouco Tempo Totalmente Obscuro!!! Obrigado por trazer Luz e Caminhos aos Interesses de Todos os Brasileiros!!! continuar lendo

Pessoal, estão incluíndo nos pedidos a declaração de inconstitucionalidade do art. 13, da Lei 8.036/90? continuar lendo

Se não estiverem, incluam! continuar lendo

Sem dúvida alguma essa sentença procedente em relação a correção do FGTS é uma das mais bem vindas e certamente muito bem recebida por todos nós trabalhadores que ao longo do tempo temos sido lesados em nossos direitos por causa da inconsequênte administração de alguns entes públicos. Obrigado Dr. Gustavo Borceda por partilhar conosco essa tão importante notícia. Resta saber agora como se dará a correção, ou seja, será necessário ações individuais de cada trabalhador ou a sentença proferida obriga ostencisavamente a CEF a corrigir o saldo de todos os FGTS's sem a necessidade de constituir advogado em ação individual? Se alguêm tiver alguma informação a esse respeito, por favor compartilhe a fim de esclarecer essa dúvida. Parabéns! continuar lendo

Caro Rogério,

Será necessário ingresso com ações individuais ou com litisconsórcio ativo sim, acredito que somente quando a matéria for estudada e sentenciada pelo STF, poderá ensejar o instituto da repercussão geral... continuar lendo

A JusBrasil,poderia atualizar os liks de todas as sentenças procedentes da ação FGTS, pois que aqui em Sorocaba, nas ações que atuo, foram improcedentes, sem citação da Caixa, com base fundamento no art. 285-A do CPC. continuar lendo